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É permitido impor tempo de consulta para médicos?

A busca por eficiência no atendimento em instituições de saúde, especialmente públicas, frequentemente leva à imposição de metas quantitativas de consultas por turno. No entanto, diferentes pareceres do Conselho Federal de Medicina (CFM) e dos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) alertam: cronometrar o tempo de consulta médica ou impor número fixo de atendimentos por hora é antiético, ineficaz e perigoso — tanto para o médico quanto para o paciente.

A consulta médica é técnica, não administrativa

A prática médica é complexa e exige tempo. O atendimento não se resume a uma troca de informações: ele envolve anamnese, exame físico, raciocínio clínico, diagnóstico e prescrição, com espaço para escuta qualificada, vínculo e empatia.

A Resolução CFM nº 1.958/10 define que a consulta médica é um ato completo que compreende:

  • Anamnese;
  • Exame físico;
  • Elaboração de hipóteses diagnósticas;
  • Solicitação de exames;
  • Prescrição terapêutica.

Esse conjunto de atividades não pode ser cronometrado ou padronizado por órgãos administrativos.

O caso da Neurologia

O tema ganhou relevância em uma situação que envolveu a Neurologia. Em parecer emitido pelo CFM após consulta à Câmara Técnica de Neurologia, destacou-se que:

“Expor o atendimento neurológico a um cronômetro é expor o profissional e o paciente a um inadequado diagnóstico.”

A Academia Brasileira de Neurologia, em pesquisa com 891 especialistas, apontou que o tempo necessário para uma primeira consulta variava entre 20 a 100 minutos. Essa variação demonstra o quão inadequado seria impor qualquer limite rígido de tempo para consultas médicas.

O posicionamento unânime dos Conselhos de Medicina

Diversos pareceres reforçam o mesmo entendimento:

  • Parecer CFM nº 30/90: nenhum órgão tem competência para determinar o número de atendimentos médicos por carga horária.
  • Parecer CRM-PR nº 2.372/12: o médico tem competência para definir o tempo necessário ao atendimento, podendo ser de minutos a horas.
  • Parecer CFM nº 1/10: reafirma a autonomia médica como cláusula ética inegociável.
  • Parecer CREMEC nº 24/02: o tempo ideal é aquele que garante diagnóstico, tratamento e qualidade na relação médico-paciente.
  • Parecer CRM/PA nº 009/12 e Resolução Cremepe nº 1/05**: não existe normatização válida sobre número de consultas por jornada de trabalho, sendo abusiva qualquer tentativa de definição externa.

Conclusão

Cronometrar consultas ou impor número fixo de atendimentos por turno não é apenas uma má prática — é uma afronta à boa medicina. Todos os pareceres citados convergem no mesmo ponto: o tempo necessário para um atendimento médico deve ser determinado pelo próprio profissional, com base em critérios técnicos, éticos e nas condições individuais de cada paciente.

Garantir esse espaço é um caminho seguro para oferecer assistência de excelência, evitar riscos legais e entregar valor real à saúde dos pacientes.

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